quinta-feira, 12 de abril de 2012

Lyres - L'Objet c'est la Poétique, Francis Ponge

O Objeto é a Poética


A relação do homem com o objeto não é devido tão somente à posse ou ao uso. É bem pior.
Os objetos estão fora da alma, certamente; contudo, eles são também nosso chumbo na cabeça.
Trata-se de uma relação no acusativo.


O homem é um esquisito de corpo, que não tem seu centro de gravidade nele mesmo. É-lhe preciso um objeto que o afete, como seu complemento direto, imediatamente.
Trata-se de uma relação mais grave (não completamente do ter, mas do ser).
O artista, mais do que outro homem, recebe dele sua carga, acusa a estocada.
Felizmente, contudo, o que é o ser? - São modos de ser, sucessivos. Ele é o mesmo que os objetos. O mesmo que o batimento das pálpebras.
Igualmente que, tornando-se nossa regulamentação, um objeto a nós concerne, nosso olhar bem como cercou-o, o discerne. Trata-se, obrigado deus, de uma "discrição" recíproca; e o artista assim toca o objetivo.
Sim, só o artista, então, sabe apreender aí.
Ele pára de olhar, retira o objetivo.
O objeto, por certo, acusa o golpe.
A Verdade se descola rapidamente, ilesa.
A metamorfose aconteceu.


Não seríamos senão um corpo, sem dúvida estaríamos em equilíbrio com a natureza.
Mas nossa alma está do mesmo lado que nós na balança.
Pesada ou leve, eu não sei.
Memória, imaginação, afetos imediatos, o embotamento; porém, nós temos a fala (ou qualquer outro meio de expressão),; cada palavra que nós pronunciamos nos alivia.
Na escritura , ela passa mesmo do outro lado.
Pesados ou leves portanto eu não sei, nós temos necessidade de um contrapeso.
O homem é um pesado navio, um pesado pássaro, sobre o abismo.
Cada "battibaleno" a nós confirma. Nós batemos o olhar como o pássaro de asa, para nos manter.
Tanto no cimo da onda, e tanto crendo nos abismar.
Eternos vagabundos, pelo menos tanto que estamos na vida.
Mas o mundo está povoado de objetos. Sobre suas margens, sua multidão infinita, sua coleção nos aparece, certamente, sobretudo indistinta e imprecisa.
Contudo, isso basta para nos assegurar. Porque, nós o comprovamos, cada um deles, ao nosso gosto, de vez em vez, pode tornar-se nosso ponto de amarração, o limite onde nos apoiar.


É suficiente, digo, que se faça o peso.
A maioria não faz o peso.
O homem, mais frequentemente, não abraça senão suas emanações, seus fantasmas. Tais são os objetos subjetivos.
Não se faz senão valsar com eles, cantando todos a mesma canção; depois se revoam com eles ou se abisma.


É preciso, pois, escolher objetos verdadeiros, objetando indefinidamente os nossos desejos.
Objetos que nós reescolhemos a cada dia, e não como nosso décor, nosso quadro; sobretudo como nossos espectadores, nossos juízes; para não ser, certamente, nem dançarinos nem palhaços.
Finalmente, nosso secreto conselho.
E assim compor nosso templo doméstico:
Cada um de nós, o tanto que somos, conhece bem, eu suponho, sua Beleza.
Ela se mantém no centro, jamais à espera.
Tudo em ordem em torno dela.
Ela, intacta.
Fonte de nosso pátio.

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